Kardec e o batom na estátua, por Marcelo Teixeira – Portal Espiritismo com Kardec – ECK

Estava no auge o caso da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos

Recentemente, a cabeleireira paulista Débora Rodrigues dos Santos foi condenada a 14 anos de prisão pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) pelos atos ocorridos em 8 de janeiro de 2023 na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Na ocasião, ela escreveu com batom a frase “Perdeu, mané” na estátua “A Justiça”, localizada em frente à sede do STF.

Antes da sentença definitiva, proferida em maio de 2025, Débora estava em prisão domiciliar, após ter cumprido dois anos em uma penitenciária. O caso ganhou repercussão porque alguns tentaram transformá-la numa espécie de musa – ou mártir – da extrema direita, alegando que ela não havia depredado, destruído ou invadido prédios, e que a condenação era desproporcional.

Na mesma época, em um conhecido ponto de Petrópolis (RJ), encontrei um deputado federal e um deputado estadual, ambos de partido de esquerda, com os quais já havia tido contato em eventos anteriores. Após cumprimentá-los e registrar o encontro com uma foto, publiquei nas redes sociais um texto apoiando a democracia e ressaltando a importância de que os responsáveis pelos atos terroristas sejam devidamente julgados, condenados e não anistiados.

A publicação, no entanto, provocou indignação de uma mulher que já assistira às minhas palestras espíritas, criticando a posição contrária à condenação de pessoas que participaram de um atentado contra o estado democrático de direito. Após intensos argumentos, optei por bloquear a pessoa, evitando maiores conflitos.

Reflexões sobre perdão, indulgência e anistia

O escritor e expositor espírita Elias Moraes compartilhou reflexões valiosas sobre perdão, indulgência e anistia. Segundo ele, o perdão, derivado do latim “perdonare” – “per” (totalmente) e “donare” (dar ou doar) – representa o ato de se doar totalmente a ponto de superar mágoas e ressentimentos. Assim, perdoar é esquecer o mal praticado, beneficiando mais quem perdoa do que quem ofende, ao se libertar de vínculos emocionais.

A indulgência é um perdão mais elaborado, que não insiste na lembrança constante do erro cometido, permitindo seguir adiante sem reviver repetidamente o passado. Por outro lado, a anistia é um perdão oficial concedido pelo Estado a crimes políticos ou tributários, que requer uma análise especializada, especialmente em contextos políticos conturbados.

O exemplo de Elias também recorda que o sistema de justiça brasileira tem permitido que condenados pelos atos de vandalismo se redimam mediante penas alternativas, reparando danos ou participando de cursos sobre a importância da democracia – medidas que já beneficiaram mais de 500 pessoas, segundo ele.

A importância do arrependimento, expiação e reparação

Para fundamentar seus argumentos, Elias recorre ao livro “O céu e o inferno”, de Allan Kardec, especificamente à primeira parte do capítulo VII – Código Penal da Vida Futura – onde se defende que o arrependimento é apenas o início do processo de regeneração. Segundo Kardec, para que ficarmos quites com nós mesmos e com aqueles a quem prejudicamos, é necessário passar também pelas etapas de expiação e de reparação.

Um exemplo ilustrativo é a história contada pelo escritor e expositor Richard Simonetti: um adolescente, ao se envolver com colegas arruaceiros, participa de pichações com consequências imediatas. Após ser detido em meio a uma correria, ele sofre um acidente que o obriga a encarar uma longa recuperação – representando o arrependimento e a expiação –, e, posteriormente, é compelido a reparar o dano, pintando o muro que ajudou a vandalizar, assumindo assim a responsabilidade por suas ações.

Do micro ao macro: atentado à democracia

Levando o exemplo do adolescente para a escala de um atentado à democracia, não se pode ignorar a gravidade de ações que envolvem a depredação de instituições fundamentais do estado – como a invasão do Congresso Nacional, da sede do STF e do Palácio do Planalto – mesmo que os danos materiais pareçam insignificantes à primeira vista. Não se trata apenas de vandalismo, mas de um movimento que busca romper com os alicerces do Estado Democrático de Direito, podendo levar a um cenário de censura, perseguições e outras abusos.

Embora alguns possam argumentar que Débora, por escrever com batom em uma estátua, não tenha causado destruição material, o fato é que ela fazia parte do grupo que articulou o golpe, atuando em conjunto com outros indivíduos comprometidos com a desestabilização da ordem constitucional. O posicionamento dela, que se estende para além do mero ato de pichação, simboliza a adesão a um movimento que visa a substituição da democracia por um regime autoritário.

A necessidade de reparação para a preservação da democracia

É lamentável que muitos, inclusive alguns que se dizem espíritas, não compreendam a gravidade desses atos, considerando os envolvidos inocentes e merecedores de anistia. Esse desconhecimento das implicações políticas e legais contribui para o enfraquecimento do debate democrático.

Retomando as colocações de Allan Kardec, o livro “O céu e o inferno” enfatiza que “o arrependimento suaviza os travos da expiação, abrindo pela esperança o caminho da reabilitação” e que “só a reparação, contudo, pode anular o efeito destruindo-lhe a causa”. A mensagem é clara: a condenação dos atos e a necessidade de reparar os danos causados são indispensáveis para que os responsáveis possam se reabilitar perante a justiça humana – e, quem sabe, também perante a divina.

A reflexão final é o apelo para que aqueles que se negam a reconhecer seus erros e a se responsabilizar pelos danos causados repensem suas atitudes. Somente por meio do arrependimento, da expiação e, finalmente, da reparação será possível restaurar o equilíbrio e preservar a democracia. Afinal, as leis humanas e divinas também visam oferecer uma oportunidade para consertar o que foi feito de errado.

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